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Coluna da Chris

Coluna da Chris: Todo Mundo é uma História

 

Autoestima: qualidade de quem se valoriza, se contenta com seu modo de ser e demonstra, consequentemente, confiança em seus atos e julgamentos (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa).

Tenho falado bastante de autoestima em relação à aparência física. Falo sobre isso porque essa é uma luta pessoal, diária e cheia de altos e baixos. Aceitar o meu corpo, a minha aparência, a forma que as outras pessoas me vêem, tendo consciência de que nem sempre será de forma positiva. Essa luta foi muito importante para que eu começasse o meu processo de valorização de quem sou. Chega uma hora que ou a gente se entrega ou reage. Eu escolhi reagir, e a primeira frase que eu usei nessa reação foi “eu sou uma pessoa”.

Só que, claro, a autoestima não tem a ver apenas com a maneira como a gente se parece, com o corpo dentro de padrões ou fora de possibilidades. Não adianta nada ter um corpinho com tudo em cima, nas medidas desejadas, e não ser capaz de se avaliar positivamente como mulher, pessoa, profissional, parceira amorosa, mãe, filha, passageira de ônibus, etc… e no etc cabe tudo que se possa imaginar.

Quando falo sobre o corpo – o meu e o dos outros – o assunto parece relativamente simples, porque a gente trata do que pode ver, mensurar, e a ideia é não rejeitar nenhum corpo, qualquer que seja sua aparência e medida. Você pode ser feliz com o seu corpo! Simples, né? Nem sempre é simples de aplicar, mas não é difícil de entender, de aceitar que isso possa ser assim.

Além disso, hoje em dia existe um grande movimento – pode chamar de reação – para que as pessoas, as mulheres em especial, digam um NÃO bem redondo às imposições sociais e às empresas que usem como estratégia de marketing a verdadeira destruição da autoimagem de alguém para em seguida oferecer a solução milagrosa. É um assunto que está em alta, é um assunto sobre o qual a gente lê e ouve quase todo dia.

O que eu gostaria de tentar, nas próximas semanas, mas que só vou conseguir se tiver a ajuda de vocês, é abordar outros aspectos da autoestima. Não é uma abordagem profissional: não sou psicóloga. Mas é o lado da mulher comum, que no consultório do médico abre uma revista feminina disponível e lê uma matéria como sobre se tornar atraente para o seu namorado. Ou sobre como conseguir um namorado, ou convencer o seu marido a respeitar a sua compulsão por compras. Ou sobre o fato de que inúmeras mulheres acreditam piamente que só terão valor social se forem casadas.

Estes temas todos também dizem respeito a mim, e a quase todas as mulheres que eu conheço. Pode ser – quem sabe – um novo passo nesse mundo fascinante da autovalorização.

E então, aceitam começar uma nova aventura?

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Coluna da Chris: a Suelen

 

Suelen mede 1,70m de altura e pesa cerca de 89 quilos. Ela já pesou mais de 100 quilos mas – dizem – foi orientada a não discutir esse assunto com a imprensa.

Apesar do tamanho e da forma do seu corpo, Suelen é uma jogadora profissional de vôlei e, na semana passada, foi convocada pelo técnico José Roberto Guimarães para a Seleção nacional que vai disputar o Montreux Volley Masters, campeonato a ser disputado entre 28 de maio e 2 de junho na Suíça.

Jogadora mais baixa de sua atual equipe, a Amil, a Suelen é uma potência. Atleta de altíssima qualidade técnica, ela teve a terceira melhor recepção da Superliga 2012/2013. Ela joga como líbero, aquela posição do fundo da quadra, especializada em recepção e defesa. Sabe aquele jogador que usa um uniforme de cor diferente nos times de vôlei? Então.

Vivendo num país com uma quantidade tão grande de jovens com sobrepeso ou mesmo obesidade, é de se imaginar que o fato de termos uma jogadora como ela – agora convocada pela Seleção do país que é uma das maiores potências do vôlei mundial – seja algo positivo, a ser festejado, elogiado, um verdadeiro incentivo para que outras garotas como ela se dediquem ao esporte… certo?

Bom, não é bem assim que a imprensa esportiva vê a coisa. Após um final de ano em que o UOL Esporte publicou matéria para afirmar que Suelen provavelmente teria sua carreira encurtada por conta do seu peso (matéria de out/2012), a convocação da moça provocou algumas reações no mínimo interessantes. “Líbero gordinha convocada”, dizia a chamada de um site de esportes. E a líbero gordinha tem nome?

Obviamente que ser gordo não é nenhum pecado, mas vá dizer isso para quem escreve e comenta sobre esportes. Ao lado de algumas chamadas de atenção por parte de apreciadores do jogo de Suelen, outros anônimos da internet diziam que se uma pessoa treina tanto assim e continua gorda, só pode ser desleixada.

A jogadora já declarou que faz dietas super rigorosas, com acompanhamento de nutricionistas, para manter a saúde em dia. Tanto é que emagreceu, no último ano, cerca de 12 quilos. Além disso, ela trabalha mais que as suas companheiras, pois tem um programa físico muito mais puxado, que inclui exercícios aeróbicos na esteira e bicicleta ergométrica. E os exames de sangue de Suelen não apresentam nenhum resultado indesejado.

Qual será, afinal, o papel do esporte e da imprensa esportiva num país como o Brasil? Certo, Suelen é diferente de suas companheiras, mas até agora isso não tem se mostrado um problema. Mas em lugar de aceitar que é um fato que pessoas mais pesadas possam praticar esporte de alto nível, um fato que pode abrir novas perspectivas para tantos jovens, quem ganha dinheiro falando de esporte faz justamente o contrário: rejeita a sua presença da mesma forma velada que gente preconceituosa faz com gordos não tão famosos. O argumento? A saúde. Mesmo que o gordo em questão não tenha qualquer problema de saúde. “Mas vai ter”, é a palavra final dos detratores.

E quem pode discutir com a bola de cristal?

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Coluna da Chris: A Julia Gabriele que há em Nós

 

Quando se junta na mesma frase as palavras aparência física e autoestima, eu sempre penso em pessoas adultas, principalmente mulheres. Porque as mulheres adultas são vulneráveis demais a tudo que os outros pensam a respeito de sua aparência. Isso nasce em alguma época, por algum motivo. Mocinhas querem parecer bonitas, tanto para os meninos quanto para outras meninas e, principalmente, mocinhas e mocinhos querem se parecer com outras mocinhas e mocinhos. Daí a gente aceita quando dizem para a gente que ser bonita é ser magra, alta, ter os cabelos lisos e por aí vai. E muita gente carrega isso pro resto da vida, mas não é por aí que vai a conversa. A conversa de hoje fica mesmo em pessoas de 11 anos, aliás, uma pessoa específica de 11 anos de idade.

Essa menina se chama Julia Gabriele. Como tantas outras crianças, a Julia Gabriele conseguiu autorização dos pais para fazer um perfil no facebook, onde postava suas fotos e as fotos dos seus ídolos adolescentes. Coisa do tipo Rebeldes. Então, um dia, um sujeito qualquer viu a foto do perfil da Julia Gabriele e achou muito engraçada. Isso porque a Julia, essa menina de apenas 11 anos, tem sobrancelhas bastante bastas, que se juntam. Este sujeito, que até pode ser um menino da mesma idade da Julia, não reparou nos olhos expressivos da menina, em como um mundo inteiro pode ser vislumbrado dentro daquele olhar. Não notou também que ela tem lindos cabelos compridos. O que lhe chamou a atenção foi o fato de ela ter sobrancelhas unidas e uma leve penugem sobre o lábio superior.

Foi o que bastou para que a foto fosse parar numa dessas páginas de trollagem. E a partir daí já não há desculpas para ninguém, porque o assédio foi tamanho que a coisa incomodou não só a Julia Gabriele, mas também os pais da menina que, dizem, procuraram a delegacia para tentar descobrir como evitar que a imagem da filha continue exposta dessa forma. Descobriram o seu perfil no facebook e passaram a enviar fotos e mais fotos de cortadores de grama. Pessoas de todas as idades – e com todo tipo de aparência física – perderam seu tempo ofendendo a menina. Ofenderam, alegaram alguns, porque ela não tirava os pelos com uma pinça, e isso é inaceitável. Outros disseram que ofenderam simplesmente porque lugar de criança não é no facebook. Já outros foram mais honestos: ofenderam porque acharam engraçado, azardelasenãogostou.

O perfil da Julia no facebook sumiu rapidamente, não sei se apagado ou se mudaram para privado. Logo surgiu um twitter em seu nome – não há qualquer garantia que tenha sido criado por ela – em que foi postada a seguinte frase: “eh muito ruim ver pessoas zombando de vc , so pq vc nao agrada elas por ser quem vc eh” (sic). E essa frase, essa frase detém tanta verdade que é chocante imaginá-la saindo da imaginação de uma menina de apenas 11 anos. É muito ruim ser transformada em alvo de zombaria apenas por ser quem você é. A Julia, como tantas outras meninas, mulheres, pessoas, não foi atrás de ninguém pedir que gostassem dela, que a aceitassem. O erro dela foi apenas ser o que é, e não se esconder.

Quando eu tinha 11 anos, eu era uma criança na mais completa acepção da palavra. Absolutamente infantil, inocente, bobinha a ponto de ser chamada de “criancinha” por outros que não eram mais velhos do que eu. Eu não era aceita em todas as rodinhas, e até algumas meninas que eram “amiguinhas” na hora de fazer lição junto ou visitar a minha casa me tratavam mal na escola, porque não pegava bem ficar perto de uma garota tão infantil. Mas eu sobrevivi, e sem grandes arranhões. Primeiro, porque eu era uma menina inteligente, apesar da inocência (embora ainda hoje me pareça estranho ver a inocência como fator de detração para quem tem apenas 11 anos). E segundo porque, na minha época, as batalhas eram campais, mas você via seu inimigo. Ele estava nos corredores da escola, ao seu lado da sala de aula. Eles tinham mais ou menos a sua idade, e você podia olhar nos olhos deles enquanto eles riam da sua aparência ou do seu jeito de criança.

O que eu espero é que a Julia Gabriele aprenda muito cedo o que é autoestima. E que, apesar de ser muito cedo para ter que encontrar tanta força, ela saiba que não tem qualquer obrigação de tirar seus pelos com pinça apenas porque os outros acham que é isso que ela deve fazer. Eu desejo do fundo do meu coração que ela sinta tudo aquilo que foi dito no tal twitter em nome dela: que ela não vai mudar apenas para agradar os outros, mas sim quando ELA quiser (não sou capim para agradar vaca, é o que está dito) e que sabe que não deve derramar mais nenhuma lágrima pelas pessoas que lhe fizeram tão mal.

Lembra da história de que nunca é tarde demais para descobrir o que é autoestima e como mantê-la em alta? Então. Com a Julia Gabriele eu aprendi também que nunca é cedo demais. Que pena.

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Coluna da Chris: Cruzadas

 

A estrada da autoestima não é uma reta sem obstáculos, asfalto liso, sinalização clara. Pelo contrário. Ela é tão acidentada e tortuosa, tão cheia de curvas e desdobramentos que a gente muitas vezes tem que pegar o mapa, correr a ponta do dedo nas linhas, tentar entender onde a gente chegou e para onde quer ir. E se a gente se confunde demais no caminho, parece que às vezes quem acompanha de longe o nosso avanço se confunde ainda mais, não entende direito aonde a gente tá tentando chegar. Por exemplo, quer ver? Autoestima não tem nada a ver com conformismo, apesar de algumas pessoas confundirem.

Ser “conformista” significa que a gente se dispõe a aceitar passivamente uma situação desfavorável sem lutar, sem tentar mudar. E isso vem a ser exatamente o oposto do que alguém em busca da autoestima procura. Na verdade, a gente tem que mudar o foco. Quem disse que a situação X, em se tratando de aparência, é desfavorável? E por quê? Então a palavra a ser repensada não é situação, e sim desfavorável.

“Desfavorável” significa contrário, adverso, hostil. Tenho cá para mim que um corpo não pode ser contrário, é impossível. Adverso a que, de que forma? E hostil, a quem? Conceitos, estes sim podem ser contrários, adversos, hostis. Mas conceitos somos nós mesmos que criamos, certo? Ou não. Na verdade, a maior parte das pessoas acata conceitos externos e os aplica no seu dia a dia como se fossem seus. Mas estes conceitos a gente só aceita se quiser, só se submete a eles se assim escolher.

“Escolher” significa selecionar, entre as opções, aquilo que nos trará mais qualidade – neste caso, mais alegria, mesmo. É que tem uma coisa que as pessoas esquecem o tempo todo, é que elas podem mudar, elas podem escolher pensar de outro jeito, agir de outro jeito, viver de outro jeito. Exemplo? “Eu não me gosto gorda”. Ok, mas sabe de uma novidade? Você pode escolher se gostar do jeito que é. Isso não quer dizer que se deva abandonar a dieta, significa apenas que é possível *evoluir* e nunca mais dizer que não se gosta por conta da sua aparência física, principalmente se você for – a maioria das pessoas é – capaz de gostar de pessoas com tipos físicos completamente diversos entre si.

“Evolução” é qualquer processo de desenvolvimento e aperfeiçoamento: de um saber, de um sentir, de um viver, mesmo. Evoluir é progredir. Ser capaz de se livrar dessa teimosia de “só me gosto assim ou assado” e passar para a plenitude, a liberdade de se gostar, ponto final, sem condições. Isso é progredir, é se dar mil vezes mais chance de ter momentos felizes. E, na verdade, é uma das coisas mais fáceis de fazer, porque não depende de qualquer outra pessoa ou variável externa, mas apenas da nossa própria vontade. Eu quis me livrar de amarras, de conceitos alheios que me diziam que eu não podia gostar de mim, ou me achar bonita, sendo como sou. Eu fiz. Mas eu só fiz porque eu quis.

Querer é desejar de verdade, é ter a firme intenção. E depois de querer, a gente põe a mão na massa para chegar lá. É a parte mais empolgante da história toda, porque é aí que a gente percebe na verdade quanto se prende, se amarra em coisas que não fazem bem – coisas que muitas vezes nem tem a ver com a forma como a gente se vê, mas sim com o jeito que imagina que os outros vêem a gente – e não trazem felicidade ou proveito.

“Proveito” é o resultado positivo de uma experiência, é aquilo que de melhor se tirou dela. E vale a pena. Tá certo que nem todo dia a gente vai estar feliz, nem todo dia vai estar tudo certo, mas isso também é importante, até para a gente conseguir ver direitinho os efeitos de não se sentir bem, o quanto isso atrapalha basicamente tudo que a gente faz.

Gostar de ser gordinha, de ser magrinha, de ser baixinha ou altona, cabelo liso ou crespo, bocão ou nariz de batatinha, querer ser o que é, ou preferir tentar emagrecer, engordar, usar salto alto ou baixo, prender o cabelo ou soltar a juba, tudo isso tá certo e é bom, desde que em qualquer situação a gente seja capaz de dizer: eu gosto de mim do jeito que eu sou hoje, e vou gostar de como parecerei amanhã, e eu já gostava desde anteontem, quando eu era bem diferente.

É fácil. É só começar.

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