Sem categoria

Reflexão

 

Guardo comigo uma memória muito nítida, de um momento de tragédia pessoal. Como era difícil aceitar que, em meio a tanta tristeza e dor (emocional e física), o sol simplesmente nascesse com naturalidade e beleza no dia seguinte – e no outro, e no outro – como se nada tivesse acontecido.

Aquela sensação de que algo muito importante se foi para sempre, e de que eu fiquei aqui, flanando na superfície das pequenas coisas. Aprendendo a lidar com essa presença vazia, a ausência definitiva.

Enquanto a vida simplesmente seguia.

O que aconteceu ontem, em Santa Maria – RS, foi uma tragédia. Um evento que atingiu fisicamente centenas pessoas e que ecoa nos pensamentos de milhões, ainda que distantes. Acima de qualquer sentimento de perplexidade, revolta e do luto inevitável de familiares e amigos, que essa tragédia transforme esse em um momento de reflexão.

Sobre a vida, sobre compaixão, e sobre a morte.

Não existe em mim profissionalismo suficiente pra falar sobre nossas pequenas alegrias cotidianas. Hoje não. Certamente nossa vida continua, mas hoje escolho que ela siga em baixíssimo volume. De brilhante e irrefreável, já basta a luz do dia, que de um modo ou de outro, recai sobre tantos que hoje sofrem a ausência de alguém querido. Em Santa Maria ou em qualquer outro lugar.

Vivi

“(…)Ninguém me disse que o luto se parecia tanto com o medo. Não estou com medo, mas a sensação é a mesma. A mesma agitação no estômago, a mesma inquietação, o bocejo, a boca seca.

Outras vezes é como estar ligeiramente embriagado, ou em estado de choque. Há uma espécie de véu entre o mundo e mim mesmo. Custa-me assimilar o que qualquer pessoa diz. Ou, talvez, o difícil seja querer assimilar o que qualquer pessoa diz. Tudo é tão pouco interessante, no entanto, quero que outros estejam a meu redor. Tenho horror quando a casa está vazia. Ah, se eles conversassem uns com os outros, não comigo!(…)

Por que ocupo minha mente com disparates? Será que tenho esperanças de que, se o sentimento se disfarçar de pensamento, sentirei menos? Não seriam todos estes apontamentos agonias insensatas de um homem que não aceita o fato de não haver nada que possamos fazer com o sofrimento, exceto padecê-lo? Quem ainda crê que haja algum expediente capaz de fazer a dor não ser dor? De fato, não importa se você agarra os braços da cadeira do dentista ou se suas mãos repousam sobre o colo. A broca continua perfurando.

E o luto ainda se parece com o medo. Talvez, de modo mais restrito, como o suspense. Ou mesmo com a espera; fazer hora à espera de que algo aconteça. Ele confere à vida um caráter permanentemente provisório. Parece que não vale a pena começar algo. Não consigo sossegar.(…)

Sentimentos, e sentimentos, e sentimentos. Em vez disso, vamos tentar pensar.(…)”

A Anatomia de uma Dor – C.S.Lewis

Deixe um comentário :D