Vivemos num país (um mundo?) em que estar dentro dos padrões estéticos vigentes é uma obrigação, e não um direito ou uma escolha de cada pessoa. Ousar desafiar este conceito é motivo para críticas, muitas vezes agressivas. Declarar-se feliz assim, então, é pedir para ser desacreditada: “quem escolheria ser gorda se pudesse ser magra?” Curiosamente, essa teoria vai de encontro à outra que diz que “só é gordo quem quer”. Vamos decidir, né, gente? Ou sou gorda porque quero, ou sou gorda porque não consigo ser de outra forma.
Eu nunca fui o tipo de pessoa que faz exercícios físicos. Tive algumas tentativas ao longo da vida, mas sempre desisti por um motivo (preguiça) ou outro (mais preguiça), sempre perfeitamente lúcidos e verdadeiros: a distância… a hora… o cabelo (na piscina, quando tentei a hidroginástica)… os coleguinhas que ficam me olhando só porque sou gorda… o preço… Apesar dessa preguiça toda, eu sempre senti grande bem estar ao fazer exercícios físicos. Todas as vezes que suei o corpinho, ao final pensei, puxa, isso é tão bom, acho que vou fazer mais vezes. Mas a vontade passava rápido, porque era sempre difícil continuar.
Eu nunca quis sequer entrar em academias porque sempre tive preconceito. É. Eu, a gorda, cheia de preconceitos contra a gente fútil que se dedica a trabalhar músculos e gastar calorias em academias. Tanta coisa melhor para fazer! Ler um livro, assistir televisão, tomar banho, comer, dormir, e… isso tudo aí. Tanta coisa! E outra, em vez de academia, poderia andar nas ruas, algo excelente (quando a pessoa consegue fazer isso). Ou então poderia fazer hidroginástica, onde o público é mais parecido comigo (senhorinhas). Então eu juntava o preconceito com a preguiça e basicamente vivi a vida toda sem fazer nada.
Até o dia em que abriram uma academia na esquina de casa e a minha irmã me arrastou para lá (precisava de companhia). E daí eu descobri um monte de coisas que eu não sabia sobre a academia. A primeira e mais importante é que lá não tem apenas pessoas super atléticas que passam a vida toda pensando unicamente na aparência de seus corpos. Lá tem pessoas de todos os tamanhos e todas as idades, e com objetivos diversos. Claro que a maioria da clientela é composta por homens jovens, mas a maioria não é o todo. Não sou nem de perto a mulher mais velha ou mais gorda a estar na academia, e também não sou a mais fraca.
A outra coisa importante que descobri na academia é que ela exige certa disciplina que, para uma pessoa como eu, é necessária. O meu problema em fazer exercícios cheios de liberdade, como andar na rua, é que me incomoda muito a falta de um lugar para chegar. Sair andando para voltar para casa, sendo andar a única finalidade, não funciona. Eu mal chego à esquina e já estou embirrada por saber que vou até ali para voltar para cá, e então para que? Ah, porque tenho que andar, mas bolas! Andar só faz sentido quando a caminhada é para me levar do ponto A ao ponto B. Se o ponto A e o ponto B ficarem exatamente no mesmo lugar, acaba todo meu ânimo.
Na academia eu consegui ter objetivos. Se for dia de musculação, eu tenho seis aparelhos para usar a cada treino, e esse se torna o meu objetivo: usar todos os seis aparelhos, sentindo os músculos se exaurirem em cada um deles. Na bicicleta ergométrica, meu objetivo é pedalar a mais de 90 rpm (nem sempre consigo), no nível 8, por 10 minutos (15 se não for dia de musculação). E na esteira, de longe o meu reduto preferido na academia, o meu objetivo é andar durante meia hora. Faça chuva ou faça sol, não existe ponto A ou ponto B: existe um cronômetro na minha frente (e uma tela de TV, o que não é nada mal) e o meu compromisso pessoal em andar ali durante 30 minutos inteiros, redondos, bonitos, todos os dias. O meu objetivo é zerar aquele cronômetro.
Eu não vou à academia para emagrecer, e sei que às vezes as pessoas tem alguma dificuldade em entender ou mesmo acreditar nisso, mas não importa. Basta-me saber. Tanto é verdade que de fato não emagreci nem um pouquinho nestes últimos meses. Mas eu gosto muito, eu gosto demais de sentir que meu corpo está a cada dia mais forte, mais resistente. A evolução me faz bem, aumenta minha confiança e melhora muito a autoestima. Todos os dias olho para mim, vejo minha aparência lamentável ao chegar em casa – o cabelo emplastrado, a camiseta molhada, as bochechas vermelhas e o suor transformando minha pele em algo aquoso e escorregadio – e penso com orgulho que hoje posso realizar mais coisas do que ontem com este corpo que já me fez tão infeliz algumas vezes e tão absurdamente feliz em outras.
Há um ano, se alguém me dissesse que eu me sentiria assim por frequentar uma academia de ginástica eu só não daria risada porque a simples ideia me irritaria bastante. Mas, outra vez, sem ilusões: a academia é apenas um acessório. O importante mesmo é que, agora, depois de (pouquíssimo mais) de 40 anos vividos, eu finalmente me dei conta que posso amar mais o meu corpo se enxergá-lo como algo além de um mostruário imperfeito para roupas bonitas ou feias, justas ou largas. O meu corpo não existe apenas para ser visto e admirado ou criticado pelos outros.
O meu corpo é o meu templo, e só a mim interessa o formato que ele tem. Fortalecê-lo um pouco a cada dia me dá a real dimensão da sua importância. Porque eu nunca mais quero dizer “tenho cabeça, não preciso de um corpo”. Eu não aceito mais relativizar a importância do meu corpo, tratá-lo com condescendência como se ele fosse a parte coitadinha de mim. Ele não é. Sou inteira: um cérebro, um espírito e um corpo. Amém.
Estou com falta de tempo pra acessar a net, mas ler os textos da cris aqui nesse blog é algo que não abro mão. Geralmente acabo não comentando, mas dessa vez vc se superou. Não somente a forma como é escrito o texto, mas principalmente a forma elegante e por vezes malcriado, mas muito necessário de dizer “Não to nem aí pro padrão da sociedade e sou feliz do jeito que sou”. Faço academia há um ano e no final da atividade me sinto muito bem… descarrego meu estresse nisso, mas tenho o objetivo de emagrecer, ao contrário do seu. Me acho bonita do jeito que sou, mas confesso que irei me achar melhor qdo tiver 20kg a menos do que me encontro hoje… Espero um dia ter a visão acerca de si mesma como a que vc tem! Vc me inspira nisso! Gde bjo e eu amo seus textos!
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Excelente post. Academia é uma opção muito saudável. E se achar que o povo é fútil demais, simples: não precisa conversar com ninguém. Quero demais poder voltar a fazer, sempre fiquei feliz da vida com aquelas dores pós exercícios rsrs
Beijinho!
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Eliane, você não sabe como foi booom ler o seu comentário! Muito muito obrigada. E força lá na academia! Ganha bastante músculo que daí os números da balança não terão mais a menor importância 🙂 Beijo.
Mag, sabe que até as pessoas são bem tranquilas? Claro que tem gente que faz exercício pro ego, não para o corpo, mas nada de muito exibicionista. Beijo!
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